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sábado, 21 de maio de 2016

Artigo escrito por mim e publicado na revista Téchne da Editora Pini.

Artigo

Patologia das anomalias em alvenarias e revestimentos argamassados

Autora apresenta as principais manifestações patológicas em argamassas de revestimentos de edificações

Por Cristiana Furlan Caporrino
Edição 230 - Maio/2016
 
Cristiana Furlan Caporrino 
Mestre em engenharia de estruturas pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da graduação e da pósgraduação da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP)
cristianafurlan@calculodeestruturas.com.br
Revestimentos argamassados, como o próprio nome diz, são compostos principalmente por argamassa. As argamassas são a mistura de um ou mais aglomerantes, agregados miúdos e água proporcionando capacidade de endurecimento e aderência.
Os revestimentos têm como principais objetivos dar um aspecto agradável às alvenarias e estruturas, proteger a edificação das intempéries, minimizar a degradação dos materiais de construção e promover a segurança e conforto dos usuários. Qualquer avaria nos revestimentos gera insatisfação dos usuários, além de custos para recuperação e possíveis danos à edificação.
Os agregados são componentes inertes que necessitam de um material ativo, o aglomerante, para que fiquem ligados. Conforme a composição forma-se a pasta, utilizando apenas o aglomerante e água, a argamassa, adicionando à pasta o agregado miúdo e com a adição do agregado graúdo forma-se o concreto. Os aglomerantes podem ser aéreos ou hidráulicos. Os aéreos enrijecem quando expostos ao ar e não têm resistência quando expostos à água, como o gesso por exemplo. O cimento Portland e a cal hidráulica são exemplos de aglomerantes hidráulicos, resistentes à ação da mesma após secos. A seguir são apresentadas as características das argamassas.
Características do material
Composição 
Agregados
A areia natural quartzosa é bastante utilizada como agregado para revestimentos argamassados. Algumas impurezas são prejudiciais para os revestimentos, tais como: aglomerados argilosos, pirita, mica, concreções ferruginosas e matéria orgânica. A expansão pode ser o efeito resultante de oxidação da pirita e das concreções ferruginosas, de hidratação de argilo-minerais ou de matéria orgânica. Vesículas esporádicas podem ser também causadas por matéria orgânica, no interior das quais se observa um ponto escuro.
Aglomerantes
Cal
A presença de núcleos argilosos, com excesso de finos na areia ou de mica em quantidade apreciável pode ocasionar a desagregação do revestimento. A mica também pode diminuir a aderência do revestimento, tanto com a base como entre duas camadas. O carbonato, principal constituinte da matéria-prima, se decompõe e inicia as reações de endurecimento e produção de cal virgem e cal hidratada. A regeneração deste componente no endurecimento da argamassa conclui o ciclo de reações, resultando da ação do anidrido carbônico do ar. A hidratação da cal virgem ocorre por meio de uma reação contínua e sua velocidade varia conforme condições de calcinação da matéria-prima. Caso essa reação não seja completa pode continuar após o ensacamento, ou pior, durante ou após a aplicação da argamassa. Quando ainda na embalagem ocorre o rompimento da mesma, porém, quando essa reação continua durante ou após a aplicação da argamassa podem ocorrer o surgimento de vesículas ou empolamento do revestimento, este último provoca o desprendimento do revestimento.
Cimento
O tipo de cimento a ser utilizado em revestimentos argamassados não é fator relevante, mas sim o teor de finos. Quanto maior o teor de finos maior a retenção de água nas primeiras horas de cura, controlando assim retração da argamassa. Porém, em idades mais avançadas a retração da argamassa aumenta com o teor de finos. Portanto, nas argamassas com maior teor de cimento e, consequentemente, maior limite de resistência, as tensões vão se acumulando e a ruptura quando ocorre é na forma de macrofissuras, muito prejudiciais ao revestimento. Por outro lado, nas argamassas cujas ligações internas são menos resistentes, as tensões são dissipadas na forma de microfissuras não prejudiciais.
Classificação das argamassas
As argamassas podem ser classificadas quanto ao tipo de aglomerante, quanto ao tipo dos elementos ativos, quanto à dosagem, quanto à consistência, quanto à densidade de massa, quanto à forma de preparo ou fornecimento. A tabela 1 apresenta as classificações das argamassas.
Tabela 1 - CLASSIFICAÇÃO DAS ARGAMASSAS
Atualmente utilizam-se principalmente as argamassas hidráulicas com cimento como aglomerante, devido à resistência mecânica e à resistência à umidade. A durabilidade dessas argamassas também é maior e com isso passaram a substituir as argamassas de cal, que, por sua vez, têm maior plasticidade e proporcionam melhor acabamento. Assim sendo a cal não mais é utilizada como aglomerante principal, mas em menor proporção melhorando a plasticidade e com isso a trabalhabilidade das argamassas de cimento. Surge assim, a argamassa mista de cal e cimento.
Funções das argamassas
Conforme o emprego dado à argamassa ela assume diferentes funções, dentre as quais, destacam-se:
Argamassa para construção de alvenarias
Quando utilizadas nas elevações das alvenarias são denominadas argamassas de assentamento. Funções: unir as unidades de alvenaria; distribuir as cargas atuantes; selar as juntas; absorver as deformações naturais, como as de origem térmica e as de retração por secagem ou origem higroscópica.
Argamassa para revestimento de paredes e tetos
São utilizados cinco principais tipos de argamassas:
- Chapisco é uma camada de preparo da base, com a finalidade de uniformizar a superfície e melhorar a aderência do revestimento
- Emboço é a camada de revestimento que cobre e regulariza a base
- Reboco é a última camada de revestimento argamassado, propiciando uma superfície que permita receber o acabamento
- A argamassa de camada única é aplicada diretamente à base e permite receber o acabamento
- A monocamada é um revestimento aplicado em uma única camada, funcionando como regularização e decoração. Ainda não é normatizada no Brasil.
Argamassa para revestimento de pisos
Quando utilizadas para revestimentos de pisos podem ser argamassa de contrapiso ou argamassa de alta resistência para piso.
Propriedades e condições das argamassas
Segundo norma NBR 13.749:2013 Revestimento de Paredes e Tetos de Argamassas Inorgânicas, os revestimentos devem satisfazer às seguintes condições:
- Ser compatível com o acabamento decorativo
- Ter resistência mecânica decrescente ou uniforme
- Ser constituído por uma ou mais camadas superpostas de argamassas contínuas e uniformes
- Ter propriedade hidrofugante, em caso de revestimento externo de argamassa aparente, sem pintura e base porosa
- Ter propriedade impermeabilizante, em caso de revestimento externo e de superfícies em contato com o solo
- Resistir à ação de variações normais de temperatura e umidade do meio.
Essa mesma norma ainda faz referência ao aspecto dos revestimentos, espessura, prumo, nivelamento, planeza e aderência.
Deve ser realizado o ensaio de aderência de revestimentos de argamassa conforme recomendações da NBR 13.528:2010 Revestimento de Paredes e Tetos de Argamassas Inorgânicas - Determinação da Resistência de Aderência à Tração para auxiliar no controle das variáveis que interferem no desempenho do produto.
Execução
Um projeto bem-elaborado não tem valia se não for bem-executado. Para tal é imprescindível a presença de um responsável técnico habilitado. Para uma boa execução, além de seguir rigorosamente o projeto deve-se também atentar a cuidados para determinados detalhes.
Uma região propícia ao aparecimento de fissuras é o encontro entre a alvenaria de vedação e a estrutura de concreto do pavimento superior. As principais causas para esta ocorrência são a estrutura transmitir os esforços aos quais está submetida para a alvenaria e a retração da argamassa.
Para prevenir as fissuras, é necessário empregar materiais e técnicas que possam absorver esses esforços e maximizar a aderência entre essas partes da construção. O encunhamento com argamassa expansiva é uma dessas soluções e deve ser utilizado quando a estrutura é pouco deformável.
Mão de obra qualificada é fator imprescindível para uma boa execução. O executor deve ter habilidade de compreender o projeto e aplicar todas as recomendações na execução. Investir na qualificação da mão de obra pode resultar em grande economia, evitando retrabalhos, desperdícios de materiais e a insatisfação do usuário final; esta última está diretamente ligada com a imagem da empresa executora.
Segundo Vieira (2006), existe um programa que foi adotado primeiramente na indústria seriada do Japão e, posteriormente, em outros segmentos industriais e países do mundo, com aplicabilidade bastante interessante para o caso da construção civil, que é o chamado "Método 5S" (senso de simplificação, organização, limpeza, higiene e disciplina).
A prevenção de fissuras nos edifícios, como não poderia deixar de ser, passa obrigatoriamente por todas as regras do bem planejar e bem construir. Mas ainda, exige um controle sistemático e eficiente da qualidade dos materiais e dos serviços, uma perfeita harmonia entre os diversos projetos executivos, estocagem e manuseio correto dos materiais e componentes no canteiro de obras, utilização e manutenção corretas do edifício etc. (Thomaz, 1989).
Outro tema extremamente relevante é a sustentabilidade. Segundo Ching (2010), buscando minimizar o impacto ambiental negativo do desenvolvimento, a sustentabilidade enfatiza a eficiência e a moderação no uso de materiais, energia e recursos especiais. Construir de uma maneira sustentável implica prestar atenção às consequências amplas e previsíveis de decisões, ações e eventos, ao longo do ciclo de vida de uma edificação, desde a concepção à implantação, projeto, construção, uso, e manutenção de novas edificações, bem como ao processo de renovação de edificações preexistentes e à reformulação de comunidades e cidades.
A busca pela Qualidade Predial Total tem despertado a conscientização de construtores e incorporadores que almejam atender às exigências crescentes dos consumidores do mercado imobiliário e atinge todos os segmentos dos produtos da construção, desde o usuário da Habitação de Interesse Social ao edifício do mais alto padrão (Gomide, Fagundes e Gullo, 2011).
Patologia das edificações
Patologia das edificações é a ciência que estuda as origens, as formas de apresentação, aspectos, possíveis soluções e como evitar que qualquer componente de uma edificação deixe de atender aos requisitos mínimos para os quais foi projetado. Anomalias podem ocorrer em consequência de um projeto não adequadamente detalhado ou de falhas na execução.
Devem-se prevenir anomalias e, quando ocorrerem, tratá-las de modo eficiente com técnicas adequadas. Serão apresentadas as mais frequentes relacionadas aos revestimentos argamassados.
Os principais requisitos a serem garantidos em uma edificação, com relação aos revestimentos são: estanqueidade à água, conforto higrotérmico, conforto acústico e durabilidade. Estes podem ser comprometidos por manifestações patológicas que devem ser evitadas ou corrigidas.
A presença de água nas edificações pode causar avarias e pode ser consequência de águas de chuva, vazamentos, de lavagem, umidade do solo e a água remanescente das atividades de construção.
Os efeitos da ação da água podem comprometer a estabilidade e as condições de habitabilidade do edifício. Dentre eles destacam-se: variação dimensional dos componentes, proliferação de microrganismos causando manchas e eflorescências, maior transmissão de calor, redução da resistência de componentes, deterioração de revestimentos, oxidação de metais, desencadeamento de processos químicos, entre outros.
O conforto térmico deve ser garantido por meio de emprego de materiais adequados e da qualidade dos serviços de aplicação dos mesmos. A grande variação de temperatura compromete não só a habitabilidade como também a durabilidade da edificação, podendo ocorrer avarias por grande dilatação e retração dos seus componentes.
O desempenho acústico não coloca em risco a segurança, tampouco a durabilidade da edificação, sendo importante, no entanto, para o conforto e a privacidade dos usuários. Deve-se atentar a este requisito uma vez que a espessura e a massa dos componentes estão sendo reduzidas para economia de materiais e diminuição da massa, proporcionando economia estrutural e de fundações. Os níveis de ruído, no entanto, tendem a permanecer os mesmos, ou sofrer aumento proporcional ao crescimento da população.
Foto: Acervo da autora

Foto: Acervo da autora
Figura 1 - Vesícula em revestimento argamassado

Foto: Acervo da autora

Foto: Acervo da autora
Figura 2 - Empolamento de revestimento argamassado
Foto: Acervo da autora
Figura 3 - Macrofissuras em revestimento argamassado
Foto: Acervo da autora
Figura 4 - Presença de fungos em fachadas
Foto: Acervo da autora
Figura 5 - Presença de fungos e escoamento inadequado do fluxo d'água
Foto: Acervo da autoraFoto: Acervo da autora
Figura 6 - Descolamento da camada externa do revestimento
Anomalias em revestimentos argamassados
As anomalias em revestimentos argamassados são consequências de vários fatores, entre os quais a composição dos mesmos. Foi feita, anteriormente, uma abordagem sobre revestimentos argamassados para um melhor entendimento de determinadas avarias.
Com base nesta breve abordagem passa-se ao estudo das anomalias.
A reação de hidratação da cal virgem, quando continua ocorrendo após aplicação do revestimento, pode causar o surgimento de vesículas nos revestimentos, a presença de impurezas em agregados também pode causar esse tipo de anomalia. A figura 1 ilustra essa avaria. O empolamento do revestimento, apresentado na figura 2, também pode ser causado pela reação de hidratação da cal virgem.
As argamassas com maior teor de cimento apresentam ruptura na forma de macrofissuras, muito prejudiciais ao revestimento. A figura 3 apresenta essa avaria.
A presença de água em fachadas de edificações causa a proliferação de fungos que provocam manchas e a deterioração dos revestimentos.
As figuras 4 e 5 ilustram este problema e mostram também anomalias decorrentes de falhas de escoamento do fluxo d'água e de manutenção.
A má aderência entre as camadas do revestimento pode proporcionar o descolamento de suas partes, conforme figura 6.
As tintas a óleo ou à base de borracha clorada e epóxi formam uma camada impermeável que dificulta a difusão do ar atmosférico através da argamassa de revestimento. Quando aplicada prematuramente, o grau de carbonatação atingido não é suficiente para conferir à camada de reboco a resistência suficiente e este acaba por descolar-se do emboço com desagregação, como ilustra a figura 7.
Foto: Acervo da autora
Figura 7 - Deslocamento de revestimento por carbonatação insuficiente
Considerações finais
Anomalias em revestimentos argamassados representam um dos conjuntos de manifestações em edificações, sejam estas causadas por falhas em projeto, execução ou materiais inadequados. Para que as boas práticas de engenharia sejam garantidas, alguns itens, entre outros, devem ser levados em consideração, tais como:
- Em todos os casos deve-se analisar a periculosidade proporcionada aos usuários e tomar as medidas cabíveis adequadas para cada situação
- Nunca correr riscos, porém, usar o bom senso e empregar todo o conhecimento técnico necessário para não condenar edificações que não ofereçam riscos, causando prejuízos desnecessários aos usuários
- Entender a responsabilidade de interditar ou não uma edificação e tomar a decisão com plena consciência técnica
- Agir com segurança e respaldo técnico
- Ter responsabilidade técnica e ética profissional.
Em caso de não poder avaliar uma situação, deve-se sempre recorrer opinião de um ou mais profissionais. É responsabilidade do profissional avaliar se tem ou não habilidade para solucionar cada caso. Não é demérito não saber, nenhum profissional é obrigado a ter uma solução para todas as situações. O importante é que a solução proposta seja a melhor técnica economicamente e proporcione segurança a todos os envolvidos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
NBR 7.200 Execução de Revestimento de Paredes e Tetos de Argamassas Inorgânicas - Procedimento. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Rio de Janeiro, 1998.
NBR 13.528 Revestimento de Paredes e Tetos de Argamassas Inorgânicas - Determinação da Resistência de Aderência à Tração. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Rio de Janeiro, 2010.
NBR 13.529 Revestimento de Paredes e Tetos de Argamassas Inorgânicas - Terminologia.Associação Brasileira de Normas Técnicas. Rio de Janeiro, 2013.
NBR 13.749 Revestimento de Paredes e Tetos de Argamassas Inorgânicas - Especificação.Associação Brasileira de Normas Técnicas. Rio de Janeiro, 2013.
NBR 15.270-1 Componentes Cerâmicos - Parte 1: Blocos Cerâmicos para Alvenaria de Vedação - Terminologia e Requisitos. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Rio de Janeiro, 2005.
Detalhes Construtivos de Arquitetura. Carranza, E. G.; Carranza, R. São Paulo: Editora PINI, 2014.
Técnicas de Construção Ilustradas. Ching, F. D. K. Porto Alegre: Bookman, 2010.
Engenharia Diagnóstica em Edificações. Gomide, T. L. F; Fagundes, J. C. P. N.; Gullo, M. A. São Paulo: Editora PINI, 2011.
Patologias em Vedações - Cuidados de Projeto e Execução. Monteiro, M. Disponível emhttp://www.planeareng. com.br/pageartigos_041123.htm. Acessado em outubro de 2014.
Inspeção e Prevenção de Manifestações Patológicas em Alvenaria de Vedação com Ênfase na Metodologia Construtiva Racionalizada. Stricker, K. B. Trabalho de Conclusão de Curso (especialista). Universidade Tuiuti do Paraná: Curitiba, 2008.
Trincas em Edifícios: Causas, Prevenção e Recuperação. Thomaz, E. São Paulo: Editora PINI, 1989.
Qualidade no Projeto e na Execução de Alvenaria Estrutural e de Alvenaria de Vedação em Edifícios. Thomaz, E.; Helene, P. São Paulo: Epusp, 2000.
Logística Aplicada à Construção Civil. Vieira, H. F. São Paulo: Editora PINI, 2006.
Patologia das Anomalias em Alvenarias e Revestimentos Argamassados. Caporrino, C. F. São Paulo: Editora PINI, 2015.

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